Da Rota da Propina à Mira de Trump: A 25 de Março no Centro de Escândalos e Disputas Internacionais

Conhecida como o vibrante coração do comércio popular de São Paulo, a Rua 25 de Março, símbolo de varejo acessível, tem seu nome agora entrelaçado em narrativas que vão do submundo da corrupção nacional à tensão de disputas comerciais internacionais. Citada tanto nas investigações da Operação Lava Jato quanto em uma recente apuração do governo dos Estados Unidos por supostas “práticas desleais”, a emblemática rua revela um papel relevante e pouco conhecido em esquemas que abalam a política e a economia brasileira.


A Rota Secreta do Caixa 2 da Odebrecht

O escândalo do caixa 2 da Odebrecht (atual Novonor), desmantelado pela Operação Lava Jato, revelou que a 25 de Março não era apenas um ponto de comércio, mas também um elo crucial na intrincada rede de pagamentos de propina e recursos não declarados a políticos. Em 2014, uma transportadora de valores contratada por doleiros parceiros da empreiteira realizava coletas de dinheiro vivo em lojas de artigos de papelaria, festas e brinquedos da 25 de Março, além de pequenas fábricas de confecção no Brás.

As mensagens de Skype trocadas por funcionários da transportadora expuseram os endereços de coleta e entrega. O serviço era executado, surpreendentemente, por policiais militares da ativa ou aposentados, que recebiam R$ 180 por dia de trabalho. Esses agentes transportavam, em simples sacolas, quantias que chegavam a R$ 500 mil, destinadas a intermediários indicados pelo “departamento de propina” da Odebrecht. As entregas eram feitas diretamente nas residências, escritórios ou flats dos envolvidos.

O esquema, que operou entre 2013 e 2015, envolvia três doleiros brasileiros que foram presos pela Lava Jato e firmaram acordos de delação premiada. Eles atuavam em parceria com um doleiro chinês, responsável por intermediar os acordos com os comerciantes da 25 de Março. O dinheiro em espécie, fruto das vendas de produtos, era coletado em troca do pagamento dos fornecedores na China. Da 25 de Março, o dinheiro era levado para salas comerciais alugadas pelos doleiros, que funcionavam como “bunkers”, e, em seguida, para a sede da transportadora na zona oeste de São Paulo, onde ficava armazenado em cofre até ser despachado.


25 de Março na Mira dos EUA e o Protesto Local

Mais recentemente, a Rua 25 de Março ressurgiu nos holofotes, mas dessa vez em um contexto internacional. O Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) iniciou, na última terça-feira (15/7), uma investigação comercial contra o Brasil, baseada na Seção 301 da Lei Comercial dos EUA – um dispositivo legal que responde a “práticas injustificáveis, irracionais ou discriminatórias de governos estrangeiros”.

O documento detalha supostas “práticas desleais” brasileiras, citando explicitamente a Rua 25 de Março, e até mesmo o Pix, sistema de pagamentos instantâneos. Além de apontar a ação judicial enfrentada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por suposta trama golpista como uma das motivações para a taxa de 50%, o ex-presidente Donald Trump, que solicitou a investigação, alegou um déficit comercial inexistente para os EUA na balança entre os dois países.

O documento americano também menciona “distribuição, venda e uso generalizados de produtos falsificados, consoles de jogos modificados, dispositivos de streaming ilícito e outros dispositivos de burla”. Ao se referir diretamente à Rua 25 de Março, o USTR afirma que “a falha em abordar eficazmente a pirataria de conteúdo protegido por direitos autorais continua sendo uma barreira significativa para a adoção de canais legítimos de distribuição de conteúdo”.

Em resposta a essa investigação, comerciantes e militantes políticos da Rua 25 de Março realizaram um protesto na manhã da última sexta-feira (18/7). Com “policiais federais” acompanhando homens fantasiados de Donald Trump (carregando um saco de dinheiro) e do ex-presidente Jair Bolsonaro (vestido como prisioneiro), os manifestantes expressaram sua indignação. As caracterizações dos políticos refletiam as demandas da manifestação, que pediam pela não interferência dos Estados Unidos na soberania brasileira e pela independência do comércio local frente ao governo norte-americano.

Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo (SECSP), que convocou a manifestação, foi enfático: “Pode ter problema aqui na 25 de Março, na região, com pirataria, entre outras coisas, pode ter. Mas quem tem que resolver é a Polícia Federal, a Polícia Militar, os poderes constituídos. Porque lá nos Estados Unidos também tem a mesma coisa que tem aqui no Brasil”.

Fonte: RO Acontece

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